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Palavras do Comandante da Marinha para a inauguração do monumento ao Almirante Marques de Leão

Senhoras e Senhores, bom dia!

Na condição de cidadão soteropolitano e baiano, ex-Comandante do Segundo Distrito Naval e, atualmente, Comandante da Marinha, tenho a grata satisfação de estar aqui hoje, tão próximo do marco de fundação desta querida cidade para homenagear um grande marinheiro, um chefe naval do passado que, ao seu tempo, teve um relevante papel na história da nossa Marinha e, também, na história de Salvador.

Homenagens como esta que hoje realizamos buscam manter vivas a memória e os exemplos de personalidades que demonstraram, ao longo de suas vidas, valores e atributos que devem servir de modelo e exemplo para as gerações subsequentes, a fim de que a virtude e a retidão possam prevalecer na construção da nossa cidadania e da nossa identidade como Nação.

Por sua brilhante e exemplar carreira, o Almirante Joaquim Marques Batista de Leão, ou simplesmente Almirante Marques de Leão, nome pelo qual era conhecido na nossa Marinha, é por nós reverenciado, inclusive emprestando seu nome a um dos principais centros de adestramento dos homens e mulheres que tripulam os nossos meios navais, o Centro de Adestramento Almirante Marques de Leão, que carinhosamente chamamos de CAMALEÃO.

Entretanto, quis a fortuna que os sólidos valores morais do Almirante Marques de Leão transcendessem os conveses dos nossos navios e os temas estritamente militares e navais. Valores como honra, fidelidade, abnegação e patriotismo, muito caros à nossa Marinha e que, por esse motivo, estão presentes na nossa Rosa das Virtudes - espécie de bússola moral que adotamos com o propósito de orientar o proceder dos nossos militares e servidores civis.

O exemplo do Almirante Marques de Leão, ao renunciar ao cargo de Ministro por não concordar com uma decisão judicial, relacionada a disputas políticas e eivada de injustiças, que determinava o bombardeio da cidade de Salvador por navios da Marinha, une marinheiros e o povo de Salvador na admiração a esse dileto vulto naval.

Seu ato de renúncia, pleno de coragem moral, traduz virtudes como a honra, sentimento que induz o indivíduo à prática do bem, da justiça e da moral; a fidelidade, de ser honesto e ter têmpera forte para agir sempre pelo bem, mesmo, e principalmente, quando esse agir não favorecer ou até contrariar as conveniências pessoais; a abnegação, de renegar a si mesmo, com a disposição de se colocar a serviço dos outros, sacrificando os próprios interesses; e o patriotismo, de quem se recusa a atentar contra o próprio solo pátrio e contra seus compatriotas.

Finalizando, recordo, com incontido orgulho naval, as sensatas palavras do Almirante Marques de Leão na carta em que renunciou ao cargo de Ministro da Marinha, naquele distante ano de 1912, justamente por se recusar a executar a despropositada ordem judicial. Disse o Almirante:

“O bombardeio da capital do estado da Bahia é uma iniquidade que atenta menos contra a Constituição brasileira que contra a civilização e a dignidade humana. Se alguma vez, senhor Presidente da República, eu fosse capaz de vos aconselhar desobediência ostensiva a um aresto do Poder Judiciário, certamente seria quando um juiz quisesse bombardear uma cidade para executar um habeas corpus. Não posso ser conivente com o ato que acaba de ser praticado (...), sob pretexto de legalidade.”

Como prova da gratidão do povo baiano, essas palavras foram gravadas em folhas de ouro e entregues ao Almirante Marque de Leão, razão pela qual tal carta entrou para a nossa gloriosa história com o nome de “Carta de Ouro”.

Assim, meus queridos amigos e amigas, registro a imensa felicidade em poder materializar, como Comandante da Marinha de todos os brasileiros, esse singelo, porém relevante, reconhecimento ao Almirante Marques de Leão, colocando um busto em sua homenagem em local tão nobre de Salvador, próximo à Avenida que leva o seu nome.

Em nome da nossa Marinha, agradeço penhoradamente a parceria da Prefeitura Municipal de Salvador, em especial ao Prefeito Bruno Reis, e parabenizo o Comando do Segundo Distrito Naval e demais organizações militares que contribuíram com este projeto cívico.

Viva a Bahia, viva Salvador!

Viva a minha querida Salvador!

Viva a Minha, a Sua, a Nossa Marinha do Brasil!

Muito Obrigado!

Breve histórico

Velho lobo do mar, do tempo em que esta simples expressão representava em sua concisa singeleza o valor de um Oficial de Marinha, Marques de Leão foi um corajoso e brioso militar, como demonstrou durante marcantes episódios da campanha brasileira no Paraguai, onde tomou parte em diversas operações de guerra, dentre as quais se destaca a legendária passagem de Humaitá, forte estratégico à margem do rio fortemente defendido pelos paraguaios e que impedia o avanço das forças brasileiras.

Em 1912, mostrou seus nobres valores e sua coragem moral ao renunciar ao cargo de Ministro da Marinha, por não concordar com ordem judicial - eivada de interesses políticos que grassavam na recém-criada República - determinando o bombardeio da capital baiana para o cumprimento de um habeas corpus.

 

A Carta de Ouro

 

Ao pedir demissão do cargo de Ministro da Marinha, por não concordar com a ordem judicial que determinava o bombardeio de Salvador, o Almirante Marques de Leão escreveu uma carta ao Presidente da República, expondo as razões da sua discordância e renúncia ao cargo.
Em agradecimento, a população da cidade mandou reproduzir essa carta em folhas banhadas a ouro, razão pela qual entrou para a história como a “Carta de Ouro”.

A Carta de Ouro

Senhor Presidente da República,

No momento de deixar o cargo de Ministro da Marinha sinto-me forçado a significar de modo positivo as causas que me constrangeram a esta resolução. O bombardeio da Capital do Estado da Bahia pelas fortalezas guarnecidas por forças federais, é uma iniquidade que atenta menos contra a Constituição brasileira que contra a Civilização e a dignidade humana.

Ele constituirá uma nódoa indelével em nossa história, um opróbrio para os seus responsáveis, a precursão de uma crise cuja gravidade ninguém poderia agora precisar, mas, que, acredito, será funesta aos que a provocaram. O bombardeio da capital da Bahia, talvez seja julgado um ato constitucional defensável.

O Senador estadual Arlindo Leone e outros companheiros obtiveram um mandado “habeas corpus” do juiz federal a este magistrado de acordo com o disposto no Artigo 6, número 4, da Constituição Federal requisitou força para a sua execução. Não há dúvida que o acatamento às decisões do poder judiciário é um dos princípios fundamentais do nosso sistema constitucional.

Mas, se alguma vez, Sr. Presidente da República, eu fosse capaz de vos aconselhar à desobediência ostensiva, a um aresto do poder judiciário, certamente seria quando um juiz quisesse bombardear uma cidade comercial de um país livre, para executar um “habeas corpus”. Colocando em um posto em que vos devo a verdade, ousarei dizê-la hoje, como até hoje a tenho sempre dito. É uma obrigação que me impõe a minha consciência de acordo com o meu passado e em consideração aos meus concidadãos e a vós mesmo.

É uma obrigação a que não me furtei nos mais difíceis momentos por que tem passado o nosso governo, já que não posso esquivar-me na desgraçada conjectura em que hoje nos vemos.

Logo no início de vosso governo nos últimos dias de dezembro de mil novecentos e dez em uma reunião do Ministério, manifestei-me contra a intervenção federal no Estado do Rio de Janeiro, acrescentando que se a União fosse forçada a essa extremidade, sua ação deveria limitar-se a colocar no poder, o presidente do Tribunal da Relação, primeiro substituto legal do presidente na forma da Constituição do Estado e sobre cuja legitimidade não havia contestação.

Ainda obedecendo ao mesmo pensamento em outras ocasiões, insisti convosco pelo respeito à autonomia dos Estados, objetivando as graves consequências que resultariam de uma conduta atentatória às bases do nosso sistema federativo. Julgava-me já tranquilo a esse respeito, pois que repetidas vezes me asseverastes, não interviríeis nos Estados e quando ontem recebi a requisição de força para execução do mandado de “habeas corpus” do juiz federal da Seção da Bahia, não poderia pensar que algumas horas depois, um telegrama do Capitão do Porto daquele Estado noticiar-me-ia um bombardeio da capital executado por fortalezas federais.

Não posso ser conivente no ato que acaba de ser praticado, sujeitando-me a ordenar a partida de forças navais para o porto da Bahia, porque reconheço a iniquidade que se pretende cobrir a vosso olhos sob um pretexto de legalidade. Foi por isso que na manhã de hoje vos declarei que conquanto o Cruzador “TIRADENTES” estivesse pronto para partir à primeira ordem vossa e o scout “BAHIA” o pudesse fazer com pouca demora, esta ordem só seria transmitida pelo meu sucessor na pasta da Marinha. Vosso amigo, vosso companheiro em momentos bem difíceis, lastimo ver-vos numa conjectura com a qual a minha consciência não me permite transigir.

Resignando o cargo em que fui colocado por vossa confiança e reiterando-vos o pedido de reforma que vos apresentei, asseguro-vos que o faço conservando a mais grata recordação das gentilezas e distinções que de vós recebí. Tenho a honra de reiterar-vos os protestos de profundo respeito com que sou - Vosso amigo muito grato.

Joaquim Marques Baptista de Leão.

Rio de Janeiro, 11 de janeiro de 1912.

Bombardeio em Salvador

 

Almirante
Marques de Leão

Carreira

O Almirante Joaquim Marques Baptista de Leão nasceu no Rio de Janeiro a 6 de janeiro de 1847, sendo filho de Joaquim Marques Baptista de Leão e de D. Luiza Leopoldina Ferreira Marques.

Matriculou-se na Escola de Marinha em 23 de fevereiro de 1863, onde concluiu com aplicação e notável brilho o curso, sendo promovido a guarda-marinha em 29 de novembro de 1865, com a classificação de número 2 de sua turma.

Logo depois, foi mandado embarcar no encouraçado “Barroso”, seguindo para o teatro da guerra do Paraguai. Comandou a bombardeira “Pedro Affonso”, trazendo-a de Santa Catarina para o Rio de Janeiro; a canhoneira ''Belmonte'', na divisão naval do Rio da Prata; e a Escola de Aprendizes Marinheiros de Santos.
Foi, durante muito tempo, 2º comandante do Corpo de Imperiais Marinheiros; comandou a Escola de Aprendizes-Marinheiros do Rio de Janeiro e, finalmente, serviu como imediato do cruzador “Almirante Barroso”, que, sob o comando de Custódio José de Mello partiu em uma longa e exitosa viagem de circum-navegação.

Em 1901, foi nomeado capitão do porto do Rio de Janeiro, posição em que esteve até 12 de dezembro de 1903, já então promovido a contra-almirante. Exerceu o cargo de membro do Conselho Naval, passando depois a comandar a Divisão de Couraçados. Foi nomeado diretor da Escola Naval, em maio de 1906, exercendo o cargo até novembro, quando foi nomeado comandante da Divisão de Instrução e Inspeção geral das Escola Profissionais. Em abril de 1907, foi novamente nomeado diretor da Escola Naval, cargo que ocupou até julho de 1908. A 15 de novembro de 1910, foi nomeado Ministro da Marinha, sendo promovido a Vice-Almirante em 17 de maio de 1911.

Durante sua administração no Ministério da Marinha, foi implementada uma ampla reforma administrativa, batizada de Reforma Marques de Leão, que tinha como objetivo descentralizar as cadeias de decisão e a execução de serviços na administração naval. Nesse período, foram criados o Comando da Defesa Móvel do Porto do Rio de Janeiro, a Divisão de Encouraçados e a Imprensa Naval.

No decorrer da sua administração, iniciou-se a construção do Arsenal de Marinha na Ilha das Cobras e foram inaugurados o Farol de São Roque (RS), o Farol da Rata (Ilha de Fernando de Noronha) e a Estação Radiográfica da Ilha do Boqueirão (RJ).

Nesse período também foram incorporados à Esquadra o Iate Presidencial Tenente Ribeiro e o Transporte Itajubá.

 

 

 

Comissões

 

- Encouraçado Barroso
- Canhoneira Ipiranga
- Patacho Iguassu
- Fragata Amazonas
- Encouraçado Herval
- Corveta Niterói
- Encouraçado Lima Barros
- Transporte Werneck
- Batalhão Naval
- Corveta Guanabara
- Cruzador Almirante Barroso
- Conselho Naval
- Escolas Profissionais

Almirante
Marques de Leão






Medalha de Bronze
da Campanha do Paraguai

Condecorações

Medalhas e Condecorações:

- Medalha de Bronze da Campanha do Paraguai
- Medalha de Prata da Passagem do Humaitá
- Medalha de Prata da Campanha do Paraguai – Argentina
- Medalha do Mérito Militar de Ouro
- Ordem São Bento de Avis (Cavaleiro)
- Ordem da Rosa (Cavaleiro)
- Ordem do Cruzeiro (Cavaleiro)
- Ordem de Cristo (Cavaleiro)

 





 

 

Homenagens

Em homenagem ao legado e nobre atitude do Almirante Marques de Leão, uma rua localizada em Salvador-BA, que até a década de 1920 era conhecida como Rua dos Coqueiros do Farol, foi rebatizada como Avenida Marques de Leão, até os dias atuais uma das principais vias da Barra.

A Marinha do Brasil também homenageou o insigne chefe naval, dando seu nome à sua mais valiosa Organização Militar de adestramento, que tem o propósito de contribuir para a capacitação de pessoal para o exercício de cargos e funções previstos nos meios navais da nossa Marinha. O Centro de Adestramento “Almirante Marques de Leão”, carinhosamente apelidado entre os marinheiros de Camaleão, é uma unidade militar de excelência, moderna e dotada de sofisticados equipamentos e simuladores.

Centro de Adestramento
Almirante Marques de Leão